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12/04/2022

Bahia, do enigma ao isolamento

Bahia, do enigma ao isolamento

A crise na Bahia anda tão grande que até já se houve falar de novo em “enigma baiano”, conceito documentado por Pinto de Aguiar em meados do século passado, algo que se entendia resolvido desde as formulações de Rômulo Almeida, implementadas por sua geração. Recuso-me a aceitar esta nostalgia como vacina para enfrentar os problemas do presente. Decididamente, não há um novo enigma baiano; nem persiste o de antes.

É verdade que a Ford veio se juntar à lista das coisas que a Bahia “já teve”. Mas este episódio é fruto de um novo elemento que também não havia antes: a globalização impõe a consideração das transformações mundiais, para não sermos “surpreendidos” com eventos desta natureza. Não bastava termos indústria automobilística, era preciso que a empresa tivesse aqui linhas de montagem de onde saíssem produtos compatíveis com as inovações tecnológicas e com o mercado global.
 
A questão logística é cada vez mais estratégica nos tempos presentes. Tenho denunciado o isolamento ferroviário da Baía de Todos-os-Santos (Salvador, BTS e o isolamento ferroviário, Correio 5/5/21). Temos o melhor porto natural do país, com um complexo portuário composto por dez portos, todos sem acesso ferroviário! A única exceção – Aratu – está fortemente prejudicado pela inépcia da concessionária FCA em relação à malha ferroviária baiana.
     
Esta situação, aliás, já estava delineada desde o plano elaborado pela Secretaria de Assuntos Estratégicos no governo Collor, então dirigida por Eliezer Batista, não por acaso um ex-presidente da Vale, empresa controladora da FCA.

Mesmo a Fiol não servirá aos interesses logísticos da Bahia se continuar se dirigindo para Figueirópolis (TO), no eixo da Ferrovia Norte-Sul – caminho dos grãos para o Arco Norte – em vez de para Mara Rosa (GO), entroncando-se com a Fico – caminho dos grãos do Centro Oeste brasileiro (e do Oeste baiano) para os portos da Bahia.

Emergem as energias renováveis – eólica e solar – como base para um novo ciclo de desenvolvimento. Mas ao invés de se pensar em atrair indústrias insumidoras de energia, estamos esperando que sejam construídos os linhões que as transportarão para o Sudeste carente.  Enquanto isto, Ceará e Pernambuco já saltaram na frente em relação ao hidrogênio verde, a energia que a Europa está precisando comprar para cumprir as suas metas de descarbonização. É pouco, mas já é um bom começo.

E o que esperar dos principais players da indústria local? A Acelen, nova proprietária de Mataripe, ainda não deu as caras para dizer a que veio; a Braskem, em compasso de espera para venda de seu controle acionário, não pensa em novos investimentos. Aliás, o Polo Petroquímico mingua continuadamente com a obsolescência tecnológica e a perda de escala de suas plantas.

Na agropecuária, o Oeste, com seus grãos, precisa de um novo impulso; o cacau, de acelerar sua recuperação; mas somos ainda importadores de carne e leite; pipocam iniciativas isoladas e dispersas na fruticultura, que precisam maturar e ganhar escala; reina grande expectativa com o Baixio de Irecê e o Médio São Francisco.

A nova estratégia de desenvolvimento precisará se apoiar fortemente na inovação. Temos hoje uma base tecnológica como nunca existiu antes, agora capitaneada pelo Cimatec, alinhado com a indústria 4.0 e o que há de mais moderno nessa área. Mas é indispensável que a Ufba volte à cena e que as universidades estaduais e federais do interior marquem presença, com cada uma assumindo o seu papel de integração com os ecossistemas locais de produção, quando menos para gerar oportunidades de trabalho para os seus futuros ex-alunos.
 
Urge construir uma nova equação para que a Bahia retome o caminho do desenvolvimento socioeconômico. É inadiável dar a volta por cima.

Waldeck Ornélas é especialista em planejamento urbano-regional, é autor de Cidades e Municípios: gestão e planejamento.